Neste post você irá conhecer as implicações da cirurgia refrativa na doença do olho seco.

O que é Cirurgia Refrativa?

A cirurgia refrativa pode ser definida como um procedimento cirúrgico ocular que objetiva a correção do erro de refração proporcionando boa visão sem ou com o mínimo de dependência de correção óptica.

São descritos quatro tipos principais de erros de refração ou ametropias:

  • Miopia;
  • Hipermetropia;
  • Astigmatismo;
  • Presbiopia.

Classicamente, esses erros de refração podem ser corrigidos com uso de lentes corretivas (óculos) e lentes de contato rígidas ou gelatinosas. Seja por motivo estético ou de não adaptação ao recurso óptico, pode se indicar a cirurgia refrativa, que se popularizou nas últimas décadas e é considerada atualmente como um dos procedimentos cirúrgicos mais realizados da medicina moderna.

Essa popularização iniciou-se com a ceratotomia radial e arqueada, realizada com uso de bisturi de diamante nas décadas de 1960-70. A ceratotomia manual foi gradativamente sendo substituída pela tecnologia do Excimer Laser, atualmente a técnica mais utilizada para correção das ametropias. Trata-se de um procedimento cirúrgico de grande precisão e segurança, realizado sob anestesia tópica (colírio), com raras complicações.

A aplicação do Laser pode ser realizada diretamente na córnea (ceratectomia fotorrefrativa ou PRK) ou por debaixo de um retalho (flap) anterior de córnea preparado com uso de um microcerátomo (LASIK) ou com uso do Laser de Femtosegundo (I-LASIK). Mais recentemente, uma nova tecnologia conhecida por SMILE tem sido preconizada. Esta técnica é realizada com a aplicação de Laser de Femtosegundo intracorneano, seguido de remoção de lentícula corneana por uma micro-incisão confeccionada pelo Laser.

Importante ressaltar que a cirurgia refrativa só é recomendável se o paciente tiver uma refração estável, olho sadio, ser maior de 18 anos de idade e mediante consulta detalhada por um especialista. A cirurgia tem excelentes resultados visuais nas ametropias baixas e moderadas. Em casos de graus muito altos, acima de 8 dioptrias, pode ser necessário outro tipo de abordagem,  como por exemplo implante de lentes intraoculares fácicas.

O que é a Doença do Olho Seco? 

A doença do olho seco, também conhecida como síndrome do olho seco ou síndrome da disfunção lacrimal, ocorre quando existe a diminuição da produção de lágrimas, ou então quando as lágrimas não possuem a qualidade necessária para manter os olhos lubrificados. Na maior parte das vezes a doença ocorre nos dois olhos, geralmente de forma assimétrica. 

A lágrima ou o filme lacrimal é constituído por três camadas: lipídica, aquosa e de mucina. A camada lipídica é a mais externa, sendo produzida pelas glândulas palpebrais de Meibomius. Sua função principal é reduzir a evaporação da lágrima.  A camada intermediária e mais espessa é a aquosa, que é constituída por água e outros componentes produzidos pelas glândulas lacrimais localizadas nos cantos laterais superiores dos dois olhos. E a camada mais interna é a de mucina, formada principalmente por células caliciformes da conjuntiva e que tem como função facilitar a adesão do filme lacrimal à córnea.  

A função principal da lágrima é lubrificar e nutrir as células da superfície da córnea e da conjuntiva. Além disso, tem importante função óptica e protege a superfície ocular das infecções e dos efeitos nocivos do meio ambiente. 

Sintomas da Doença do Olho Seco 

O paciente que apresenta olho seco pode apresentar uma série de sintomas, os mais comuns são:  

  • Sensação de corpo estranho ou areia nos olhos;
  • Ardor nos olhos;
  • Irritação;
  • Olhos vermelhos;
  • Produção excessiva de lágrimas (olhos lacrimejantes) – em alguns casos iniciais do olho seco evaporativo;
  • Visão turva ou embaçada que melhora ao piscar;
  • Desconforto na leitura, ao assistir televisão, e em frente à tela do computador;
  • Dor ocular.

 

 A Cirurgia Refrativa pode causar a Doença do Olho Seco?

Os procedimentos cirúrgicos refrativos têm evoluído rapidamente nas últimas décadas. As técnicas cirúrgicas, as taxas de sucesso e os resultados visuais melhoraram, enquanto que as complicações que ameaçam a visão diminuíram. No entanto, os sinais e sintomas da doença do olho seco permanecem comuns no pós-operatório precoce.

O LASIK continua a ser o procedimento cirúrgico refrativo mais realizado na maioria dos países. Sua segurança é excelente, mas a indução do olho seco continua sendo uma das principais razões para a insatisfação dos pacientes após sua realização. A incidência de olho seco após LASIK foi estimada em aproximadamente 50% dos casos em uma semana, 40% em um mês, reduzindo para entre 12,5 e 48% até o 6º mês de pós-operatório. O retalho fino do LASIK realizado com laser de femto-segundo mostrou causar menos alteração no tempo de ruptura da lágrima, secreção lacrimal e escore do Índice de Doença da Superfície Ocular em comparação com os retalhos realizados com uso de microcerátomo.

Pacientes submetidos ao PRK também experimentam redução significativa na secreção lacrimal no início do pós-operatório. Sintomas de doença do olho seco relatados pelo paciente foram encontrados em 43% dos pacientes após PRK até 6 meses de pós-operatório. A maioria dos pacientes se recupera, mas uma pequena porcentagem desenvolve olho seco crônico ou experimenta dor neuropática ocular.

No LASIK, a redução da sensibilidade corneana é um fenômeno atribuído à amputação dos nervos corneanos estabelecida durante o corte e preparação do retalho corneano. No PRK, essa redução se deve à ablação dos nervos do estroma superficial corneano pelo excimer laser. Após o LASIK, há uma redução acentuada na densidade e no padrão do plexo nervoso subbasal da córnea, que pode levar mais de 5 anos para se recuperar aos valores padrão, conforme avaliado com microscopia confocal in vivo. A função sensorial reduzida dos nervos corneanos reduz o estímulo neural à glândula lacrimal e à secreção lacrimal basal. Além disso, a função neural eferente seria afetada, diminuindo o reflexo e a frequência do piscar. A estabilidade do filme lacrimal é também reduzida devido à forma alterada da córnea e à secreção prejudicada de mucina por células caliciformes danificadas da superfície ocular. O dano das células caliciformes é atribuído principalmente à ação da sucção do microcerátomo no LASIK, mas também foi demonstrado no PRK, indicando que outros parâmetros, como a toxicidade dos colírios e a inflamação, podem contribuir para sua instalação.

Existem fatores predisponentes à doença pós-operatória do olho seco, que incluem principalmente doença do olho seco pré-operatória e disfunção da glândula meibomiana. Assim, o tratamento pré-operatório da disfunção da glândula meibomiana pode melhorar os resultados pós-operatórios. O uso pós-operatório de medicamentos com conservantes, como esteroides e antibióticos, pode exacerbar a agressão na superfície ocular e a doença do olho seco. O uso de colírios sem conservante pode minimizar essa agressão e diminuir os sinais e sintomas de olho seco no pós-operatório.

Discussão e Conclusões

O impacto do olho seco causado pela cirurgia refrativa na população normal parece ser mínimo e é expresso por queixas subjetivas e sazonais de sensação de corpo estranho, sem maior prejuízo aparente à saúde ocular do paciente. Porém, serve de alerta para que nossa avaliação e triagem previa à cirurgia refrativa não se restrinja somente aos aspectos de refração, espessura e curvatura da superfície anterior da córnea.

Dessa forma, preconizamos incluir uma avaliação detalhada da superfície ocular e do filme lacrimal, que se inicia com história clínica do paciente e de minucioso exame que inclui exame de biomicroscopia, com uso de tecnologia de imagem e corantes vitais. Certamente, pacientes com doenças do colágeno (principalmente a artrite reumatoide do adulto), doenças cicatriciais da superfície ocular (como a dérmato-cérato-conjuntivite atópica) e história de olho vermelho crônico devem ser colocados sub suspeita e ter sua superfície ocular e filme lacrimal avaliados por meio dos testes específicos como testes de Schirmer, tempo de ruptura do filme lacrimal (invasivo ou não), teste da rosa bengala ou da lissamina verde, teste do “clearance” da fluoresceína, medida da osmolaridade lacrimal, para citar os menos dispendiosos financeiramente e fáceis de realizar no consultório de qualquer oftalmologista, sem necessidade de maior aparato tecnológico.

Uma vez detectado distúrbio do filme lacrimal e avaliada sua magnitude e significado clínico, o oftalmologista deverá, nos casos de olho seco severo, contraindicar o procedimento cirúrgico e explicar de maneira didática ao paciente as razões de tal conduta, além de orientá-lo quanto ao tratamento específico do problema.

Apesar da diminuição, dentro dos limites normais, da produção da lágrima reflexa, tal alteração parece não trazer problemas maiores em pacientes normais. Suplementação com lágrimas artificiais sem conservantes e imunomoduladores podem ser necessários para pacientes sintomáticos nos primeiros meses após a cirurgia até que ocorra o restabelecimento da inervação e do equilíbrio da superfície ocular e do filme lacrimal.

Tratamentos mais específicos, como luz pulsada, tratamento termodinâmico (iLux, Lipiflow), oclusão dos pontos lacrimais e até colírio de soro autólogo podem ser necessários nos casos mais graves de olho seco induzido por cirurgia refrativa.

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Autores:

Dr. José Alvaro Pereira Gomes

Oftalmologia Clínica e Cirúrgica

CRM-SP: 66.306

Dra. Andrea Kfouri Pereira Gomes

Oftalmologia Clínica e Cirúrgica

CRM-SP: 67.382

Fontes:

Quantitative changes in tear film after refractive surgery: comparative study between PRK and LASIK

https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/17505714/

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